30|10|2020

Artistando com a BNCC: planejamento, registro e avaliação no ensino

 

Por: Prof. Arthur Muller e Prof. Hugo Nunes

Ao analisarmos o planejamento, o registro e a avaliação do ensino na escola, uma série de inquietações são fomentadas, algumas perpassam por questões relacionadas ao cultivo de uma aversão absoluta ao chamado tecnicismo e que acaba culminando na negação do planejamento, do registro e da avaliação enquanto práticas de ensino. Podemos destacar também, uma certa luta pela hegemonia do que venha a ser o planejamento, registro e avaliação do ensino, onde os discursos produzidos por certos sujeitos adquirem força através da sua posição de poder e, com isso, estabelecem regimes de verdade acerca dos objetivos em questão. Neste contexto, é possível pensarmos o planejamento, o registro e a avaliação do ensino em outra perspectiva? Uma possibilidade é pensarmos estas práticas pedagógicas como rizoma ao invés de uma prática pautada no pensamento arbóreo.

Raízes e árvores são termos para o que hierarquiza, burocratiza, centraliza, submete à lei, reproduz o já feito, remete à representação, ou seja, tudo o que não compreende ou não suporta a multiplicidade. A árvore é a imagem de estruturas ou eixos que produzem sobrecodificações e suporta a reprodução ao infinito. Já o rizoma é um sistema a-centrado, aberto, sem ligações pré-estabelecidas. Alastra-se por contágio, propaga-se entre uma região expandindo seus limites e superfícies de contato (BENEDETTI, 2007).

Diferentemente do que vemos em grande parte dos sistemas educacionais, pensar as práticas pedagógicas a partir da ideia de rizoma, é inventar e imaginar outras maneiras possíveis de fazer pedagogia. Podemos aventar que uma prática pedagógica rizomática suscita entrar pelo meio, sem raízes, galhos, folhas ou troncos, mas espraiar, avançar a partir do que nos afeta, pensar a escola como espaço de experimentação, fazermos conexões e como grama, brotar pelo meio, estarmos abertos ao devir.

É justamente em oposição ao caráter hierárquico e asfixiante da árvore que o projeto rizomático emerge como possíveis ao possível da educação. Um encontro errante, vagante, nômade, que conversa com ao invés de falar sobre. Trata-se de nutrirmos nossas aulas com aquilo que proporciona potência de vida, marcado pelo desejo ético e estético da criação (LINS, 2005).

Num currículo assim, a aprendizagem refere-se a algo singular, e não como os arautos da verdade a concebem, como uma relação direta, linear, ou seja, tudo o que ‘eu’ professor ensino, ‘eles’ estudantes aprendem, ou deveriam aprender. A aprendizagem deixa de ser arborescente e passa a ser rizomática (NUNES; NEIRA, 2020, p. 6).

No que concerne ao planejamento de ensino pensando-o a partir do rizoma, entendemos que este sofre um deslocamento do plano técnico-racional para o campo artístico-pedagógico comprometido com a multiplicidade e a diferença. O docente precisa estar atento para que as múltiplas formas de conceber a realidade sejam legitimadas e que o conhecimento não seja unidade, e sim, multiplicidade (NUNES et al, 2016). Porém, nesta ambiência temos que estar cientes que os caminhos percorridos pelos estudantes não serão os mesmos, sendo assim, temos que estar preparados para aprendizagens heterogêneas que ocorrerão a partir das relações estabelecidas em aula e deixar “adormecida” a ideia de aprendizagem homogênea, aquela que acontece no mesmo espaço-tempo para todos/as.

Neste entendimento, os registros docentes desempenham uma função essencial para a reorganização das atividades de ensino a partir dos acontecimentos verificados durante a aula.

O registro como recurso para avaliação é encarado como um texto em constante construção, assim como toda a prática cultural, o que se distancia dos modelos avaliativos das propostas convencionais que excluem e classificam os alunos e alunas. (MÜLLER; NEIRA, 2018, p. 783)

O registro cumpre a importante função de instrumentalizar os docentes com informações suficientes que proporcionem os próximos encaminhamentos. Para tanto, o professorado deve lançar mão da maior quantidade – e variedade – possível de registros.

Acreditamos que a ampliação das fontes de registro, como a confecção de quadrinhos, blogs, páginas ocultas em redes sociais, poderiam enriquecer a coleta de informações, o que, possivelmente, indicaria com mais visibilidade outros tantos caminhos para problematizações. Afinal, como já mencionado anteriormente, quanto mais informações acerca das diferentes práticas a serem tematizadas, melhor e mais completo será o trabalho junto aos estudantes. (MÜLLER, 2016, p. 146).

Isto posto, o planejamento docente a partir dos registros dos acontecimentos das aulas, trilham um caminho “rizomático”, impensável de antemão, imprevisível (exatamente por considerar outros aspectos que comumente são colocados para fora da aula), descentralizando o papel da avaliação. Dito de outra forma, a prática avaliativa recai sobre o docente, à medida que este, ao se debruçar sobre os registros com o objetivo de oportunizar outros olhares para a prática estudada, analisa (avalia) se as situações didáticas caminharam no esse sentido proposto. Trata-se de olhar para toda a sua prática pedagógica, avaliando se as situações didáticas oferecidas durante as aulas, contribuíram para a ressignificação das leituras que as crianças, jovens e adolescentes faziam – tinham – sobre as diferentes coisas do mundo.

Referências
BENEDETTI, S. C. G. Entre a educação e o plano de pensamento de Deleuze & Guattari: uma vida… 2007. 178 f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo/SP, 2007.

LINS, D. Mangue’s school ou por uma pedagogia rizomática. Educação & Sociedade, vol. 26, n. 93, p. 1229-1256, Centro de Estudos Educação e Sociedade, Campinas/SP, 2005.

MÜLLER, A. Avaliação no currículo cultural da Educação Física: o papel do registro na reorientação das rotas. 2016. São Paulo. Dissertação (Mestrado em educação). Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. São Paulo: FEUSP, 2016.

MÜLLER, A.; NEIRA, M. G. Avaliação e registro no currículo cultural da Educação Física. Estudos em avaliação educacional, v.29, n.72, p.774-800, set/dez.2018.

NUNES, H. C. B.; NEIRA, M. G. Rompendo com currículos identidades: por uma produção curricular sem imagens. Revista Cocar, v. 14, n. 30, 2020.

NUNES, H. C. B.; NEIRA, M. G. ; FREITAS, J. P. A. . O planejamento de ensino em uma ‘nova’ paisagem social. Revista Brasileira de Educação Física Escolar, v. 2, p. 28-42, 2016.

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